O objetivo principal deste trabalho é discutir o enorme potencial de ganhos que podem ser auferidos mediante o planejamento e execução de uma logística integrada no ramo de laticínios no Brasil, principalmente no que se refere ao leite “in natura”, por sua característica de coleta “porta a porta” sem que se disponha de uma infraestrutura de vias de acesso minimamente conservadas e, até mesmo de mapas indicativos destas vias de acesso.
Pressionados pela entrada no mercado de competidores transnacionais, os laticínios brasileiros foram obrigados a demonstrar sua capacidade de ajuste e criatividade para reduzir seus custos, sendo o melhor aproveitamento das capacidades instaladas uma das maneiras mais claras.
O aprimoramento da Logística, por sua capacidade de atuar nas diversas fases do processo produtivo integrado é, talvez a maior oportunidade a ser trabalhada neste processo, uma vez que poucos destes laticínios tem realmente utilizado a Logística como uma ferramenta especializada na gestão do processo, limitando-se alguns deles à adoção de algumas medidas isoladas.
A logística como o grande potencial
Toda uma gama de transformações ocorridas nos cenários econômicos tem levado as empresas em geral a alterar seu processo de gestão, preocupadas cada vez mais com a competitividade, focando a chegada do seu produto ao consumidor final ao menor preço e melhor qualidade.
Para isso, necessita fazer um detalhamento de toda a cadeia do negócio, tanto em termos de qualidade quanto de preços.
Por outro lado, esta mudança tem levado as empresas a concentrar seus esforços na sua atividade fim, tornando cada uma delas especializada e focada.
Uma empresa industrial por exemplo, seja qual produto industrialize, tem hoje seus esforços voltados para a produção, não tendo no processo produtivo um diferencial. Ela como todos os seus concorrentes, utiliza equipamentos adquiridos de empresas especializadas na produção destes equipamentos, compra matérias primas de fornecedores especializados e vende seus produtos para os mesmos consumidores.
Partindo-se do pressuposto que os concorrentes tem alto grau de eficiência, todos estão equilibrados quanto aos custos de matéria prima, produtividade e custos de produção e concorrem no mercado por preços que tendem a ser iguais a médio e longo prazo.
Assim sendo, temos dois grandes campos para a conquista do diferencial competitivo que são:
-A gestão de pessoas – campo infinitamente amplo e que tem sido tratado com todo o cuidado pelas modernas empresas atuais, mas nunca é demais ser lembrado.
-A Logística se mostra como a condição de competitividade que possibilitaria produzir e distribuir ao menor custo e na forma que o consumidor deseja.
A função da logística é exatamente fazer com que os consumidores tenham os produtos quando e onde quiserem e na condição física que desejam, racionalizando os recursos necessários, estando aí o seu enorme potencial de ganhos.
A logística no leite
Em se tratando do leite, os pontos mais sensíveis da logística dizem respeito principalmente à transferência da matéria-prima até o laticínio, etapa a que as empresas já estão dedicando maiores esforços para racionalizar custos, como são os casos da granelização e do resfriamento na propriedade, do transporte (veículo e roteirização) e da localização das unidades receptoras.
A logística que envolve a transferência do leite da propriedade aos laticínios pode ser resumida em 3 operações básicas:
A. Retirada do leite das fazendas; B. Transporte até a unidade fabril;
C. Estocagem do leite.
O que deveria ser destacado é que racionalizar custos por meio da logística não é meramente tratar uma sequência de atividades como se elas se encerrassem em si mesmas, mas o tratamento do processo como uma cadeia de suprimentos integrada.
A logística como processo integrador permite visualizar o desenho da rede logística, a qual deve ser a expressão espacial de todos os pontos de origem-destino numa cadeia e suas interligações. Essa visão possibilita às empresas uma série de tomada de decisões, que dirão respeito às estratégias possíveis a serem implementadas.
Dessa forma, o transporte do leite integra uma preocupação mais abrangente que diz respeito à busca da racionalização de custos. As possibilidades de contribuição do transporte podem ser localizadas no aprimoramento do gerenciamento logístico, que será refletido no menor número de veículos em operação e na localização dos laticínios.
As possibilidades de redução de custos de transporte podem ser reflexas às estratégias para alocação de fornecedores, de coleta em dias e horários alternativos, de aumento da capacidade de transporte (t/caminhão) com aumento da capacidade de armazenamento na fazenda. Isso deve possibilitar redução do custo unitário do transporte da matéria-prima (R$/l), pela maior agilidade das operações de carga/descarga, distribuição geográfica das fazendas e da roteirização.
Assim, a eficiência é determinada em boa parte pela relação km rodados/litros de leite coletados (em uma certa unidade de tempo), assim como pela maior taxa de utilização dos equipamentos de transporte O planejamento e a simulação de alteração dessas relações com base no ponto ótimo indica um dos caminhos proporcionados pela logística integrada para a obtenção de menores custos.
As decisões logísticas estratégicas a serem tomadas podem, por sua vez, estar baseadas na proximidade do mercado (consumidor) ou proximidade dos fornecedores (fazendas). A teoria da localização chama a atenção para possibilidades de localização ótima diferentes (em relação aos mesmos mercados), que acontece em função de diferentes custos logísticos associados a diferentes produtos.
A maior parte do transporte de leite no Brasil, no percurso fazenda-unidade de beneficiamento, ainda é realizado em caminhões de carroceria de madeira, acondicionados em latões. São usualmente coletados diariamente em palanques à beira das estradas, ou nas fazendas por onde passam as linhas de leite, seguindo até as plataformas de recepção das unidades de beneficiamento.
No Brasil, o transporte a granel vem desfazendo a crença de que ele só se aplica a linhas de leite de grandes produtores, com diversos exemplos positivos de resfriamento e granelização em pequenas propriedades, além do que estamos atravessando uma readequação que deverá implicar profundas alterações no setor, que é a coleta a granel do leite na propriedade. Pelo novo sistema, o leite produzido nas fazendas deverá aguardar a coleta na propriedade, com o produto em tanques de resfriamento e que será transferido por sucção para o veículo, e prevê-se, pelo Programa Nacional de Melhoria e Qualidade do Leite, que até junho de 2005, para as regiões Sul, Sudeste e Centroeste e junho de 2007 para as demais regiões, o leite esteja resfriado a menos de 7ºC na fazenda em menos de 3 horas após a ordenha. Essa obrigatoriedade forçará o transporte a granel.
Custos de transporte
Um fator de elevada importância no processo decisório aliado ao planejamento dos transportes é a escolha do equipamento especifico para cada tipo de utilização.
Somente como exemplo, em levantamento realizado pela EMBRAPA/CNPGL, para comparar custos de transporte a granel com transporte em latões, para o mesmo volume e mesma distância, considerou-se:
Um caminhão diesel com tanque isotérmico para 8.000 litros com bomba e um caminhão diesel com carroceria de madeira capaz de transportar 7.500 litros de leite em latões
Os custos para transporte de 1.000 litros de leite pelo caminhão isotérmico foram 28,2% menores que os custos no transporte por latões
Dentro desta mesma realidade, estudos práticos realizados em uma das muitas bacias leiteiras da região sudeste demonstrou a existência de roteiros de coleta (as chamadas linhas de leite), montados absolutamente ao acaso, sem nenhum critério ou base lógica, que faziam com que um grande número de veículos fosse usado na tarefa com baixa produtividade, alto custo e baixa remuneração para todos os envolvidos.
As razões deste tipo de situação são as mais diversas e passam pela inexistência de mapas atualizados com a malha de estradas vicinais, entra pela tradição no tipo de negociação com os produtores que não leva em conta a possibilidade de coletas em horários alternativos (o resfriamento permite este tipo de visão) e desemboca no uso pelos laticínios, de transportadores autônomos que acabam sendo “donos” de suas “linhas” e as administram como melhor lhes convém.
Estes estudos demonstraram que a implementação de roteiros mais racionais com um melhor aproveitamento dos veículos envolvidos e uma visão do todo, podem reduzir os custos totais em até 33%.
Conclusão
Conclui-se portanto que um dos mais importantes caminhos disponíveis para a adequação de custos na indústria de laticínios é a utilização das ferramentas disponibilizadas pela Logística, permitindo-nos afirmar que na maioria das situações não se faz necessário nenhum aporte de verbas adicional no médio prazo, ou seja, a própria economia paga os investimentos.
Fonte: Artigo de João Carlos Dall Aneze – MilkPoint